“Não é bom que o homem esteja só” (Gn 2,18). Essa frase ecoa desde o princípio do mundo: vida e amor, os dois caminham juntos. Deus, em Sua sabedoria, não nos quis isolados, mas plenamente inseridos em relações que nos empolguem e que também nos desafiem e transformem.

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Primeiro passo: sair de si mesmo
É mais fácil viver isolado no mundo das próprias certezas, dos próprios gostos, das próprias manias. Mas o chamado divino nos impele à comunhão com o mundo e com o outro. São João Paulo II, na Teologia do Corpo, ensinou que somos “capazes de doar-nos a nós mesmos e, na reciprocidade desse dom, realizar o mistério da comunhão dos santos”. Amar a dois é, portanto, entregar-se e participar desse mistério — dar sem orgulho, receber sem medo.
Construir uma relação saudável exige escuta ativa. Quantas vezes repetimos nossas demandas querendo ser ouvidos? A vida a dois floresce quando aprendemos a ouvir com o coração: os silêncios, as dificuldades, os planos do outro também falam. Não é necessário um grito de socorro quando existe um olhar atento.
Amar também é dialogar com as necessidades alheias. Se meu cônjuge sente a falta de tempo juntos, é sinal de que eu preciso renunciar a algo — trabalho excessivo, distrações digitais. O apego ao “meu mundo” impede o amor de criar espaço em nós. Precisamos, como o samaritano, curvar-nos sobre o outro, cuidar de suas feridas, regar com atenção o jardim da intimidade.
Relacionar-se a dois não é somar comodidades, mas enfrentar desafios
Cada diferença é uma oportunidade de crescer em paciência, humildade e perdão. Quando ele erra, ela aprende a perdoar; quando ela cai, ele veste as “armas da luz” para levantá-la (Rm 13,12). E assim, juntos, tornam-se mais fortes do que cada um já foi algum dia isoladamente.
No fundo, viver a dois é ecoar a vida de Deus, que é comunhão perfeita. É descobrir que, na entrega mútua, nos tornamos instrumentos de Sua graça e sinal de esperança para o mundo ferido pelo egoísmo.
Flavio Crepaldi
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